sábado, 14 de março de 2015

Os sentidos



A língua
Se um dia os sabores das coisas não mais existir ou me for ausente
A mim tão pouco importaria
Morreria de fome, à míngua, apenas com a saliva do céu da boca e o ar que nela habita.

O tato
Se me amputassem os membros inferiores ou quaisquer dos órgãos vitais, pouco me importaria. Já estaria morto, porém vivo. Vivo e morto.

A visão
Se me arrancassem os olhos não reclamaria, o olho é o que faz morrer. Seria santo. Um santo sem olho, é claro, um mártir com a bandeja na mão e os olhos esbugalhados a me olhar.

A audição
Se não mais tivesse a audição pouco me importaria, viveria com a vibração das coisas, me arrastaria como serpente a descobrir o tempo e o som das coisas.

O olfato
Se me retirassem o cheiro das narinas estaria tão inútil e tão débil, que não me importaria se me faltassem os outros sentidos. Não me tirem o cheiro!
Nem do aroma, nem do podre, nem do vil. Isso me faz útil.

Reconheço ali ao longe o cheiro do amor, da dor, das desilusões.
Por favor, retirem-me o tudo e o nada. Deixem apenas o cheiro. É o que me faz útil.